sábado, 21 de junho de 2014

TEMPO...
É Quase Meia-Noite!



Quem sou eu para o definir e explicar? Ouço a sua pulsação no tic-tac do relógio e fico absorta a meditar nos seus mistérios e implicações, na extensão dos seus domínios, no fatalismo da sua relação com a vida... Inflexível, inexorável, impiedoso - quem pode competir com ele? Ai de mim se não acerto o meu passo pelo seu nos trabalhos e compromissos que me desafiam! Ai do artista que se não deixasse reger pela sua batuta ou que ignorasse as suas marcações nos compassos que se propusesse interpretar!...
O que é tempo? Em vão eu me consumiria tentando transpor a barreira imposta pela queda dos maiores cérebros da História - Adão e Eva. Os mistérios com que me debato estiveram patentes ao seu estudo até ao momento em que o mau uso da divina faculdade do livre arbítrio encontrou espaço para a primeira fatalidade do tempo... Agora, aqui estou eu, sob o fascínio da superfície iluminada do meu globo terrestre, pensando em meridianos e fusos horários, relacionando o tempo com os movimentos da Terra e com o Sol, com factos, espaço e velocidade, evocando o relato bíblico da criação da primeira semana do mundo, limitada pelo marco divino - o Sábado - e o milagre! da sua preservação até aos nossos dias...
Mas tempo é mais, muito mais do que isto!...
Santo Agostinho, certa vez, lançou a pergunta e confessou: "Se ninguém me pergunta, eu sei; se desejo explicá-lo a alguém que pergunte, eu não sei."1 A explicação continuou dramática ao longo dos séculos após a confissão do conhecido teólogo de Hipona, e não ficou mais fácil depois que o genial autor da E=MC² alargou o horizonte científico com as revolucionárias teorias da relatividade. "O tempo não é mais explicado como uma variável uniforme - uma linha extensa de tempo na qual os eventos podem ser localizados - mas o tempo é agora visto como sendo ele mesmo determinado pelos eventos."2


Em breve, quando se escoarem as últimas areias da ampulheta e, vencida a lei da gravidade - o pecado -, alçarmos voo com Jesus através do túnel deslumbrante do Orion, rumo ao Edén restaurado; quando as densas trevas do tempo forem dissipadas pela "luz inacessível"3 da eternidade, então não haverá mais definições obscuras, e intrincadas teorias sobre a Criação, concebidas à margem do Livro do Criador!... "As coisas difíceis de se compreender terão ali explicação."4 Ser-nos-á revelado o "decurso do grande conflito que teve a sua origem antes que começasse o tempo e terminará apenas quando este cessar."5 "Todos os tesouros do Universo estarão abertos ao estudo dos filhos de Deus."6 Todavia, se é certo que aqui ainda não sabemos tudo sobre nada, ali, nunca saberemos tudo sobre tudo, pois "surgirão novas culminâncias a galgar, novas maravilhas a admirar, novas verdades a compreender, novos assuntos a apelarem para as forças do corpo, espírito e alma."7 Teremos a eternidade para o estudo do infinito. Não faltará tempo para o espaço nem espaço para o tempo...

Até lá, continue a picareta do arqueólogo a dilacerar as entranhas da terra e pondo ao sol as pegadas do tempo! Continuemos a recordar com admiração e respeito Albert Einstein - o mágico do tempo, o brilhante cientista que alguns anos antes de descer ao pó - a matéria que tanto o apaixonara! - finalmente reconheceu no universo a presença de "um poder racional superior!"8 Não nos desencantemos do estudo do tempo à luz da física e da astronomia, mas demos prioridade e particular atenção ao que o tempo representa na vida de cada um.

Enquanto permanecermos neste vale de lágrimas, viveremos no tempo e seremos afectados pela sua passagem, quer estejamos na típica aldeia do Piódão, quer na vertiginosa cidade de Nova Iorque. Nem cosméticos, nem cirurgias plásticas ou quaisquer artifícios, poderão confundir o tempo, pois ele não deixa as suas marcas apenas no nosso rosto, na cabeça, quiçá na coluna, mas dentro, bem dentro de nós, para além das artérias, do coração e até da mente - no próprio espírito!
Não tentemos, portanto, driblar o tempo. Não conseguiremos violar impunemente as suas leis. O êxito e o fracasso, a prosperidade e a miséria, a cultura e a ignorância, a saúde e a doença, acima de tudo o nosso destino eterno, dependem mais do que talvez imaginemos do grau de percepção destas realidades. Não teremos saúde se tresnoitarmos, porquanto fomos biologicamente programados para dormir quando escurece e despertar quando amanhece. Não lograremos êxito, qualquer que seja o empreendimento, esbanjando tempo, pois o tempo é um capital de reposição impraticável.
Albert Schweitzer, famoso médico missionário e um dos homens mais notáveis do século XX, disse tristemente, já quase no limite de uma vida de sacrifício e abnegação: "Algumas vezes eu desejo poder ficar parado numa esquina da rua, com o chapéu na mão, a fim de que os transeuntes possam lançar a mim suas horas supérfluas."9


Que faremos, então, para remir a soma de minutos e horas dissipados em conversas frívolas e diversões objectáveis, não considerando os já sobejamente destacados malefícios do uso indiscriminado e intemperante da TV? Que faremos, enfim, para remir as preciosas fracções de tempo sacrificadas no altar da ociosidade, do egoísmo, da vaidade e do prazer? Que faremos, enfim, para remir os meses, quiçá os anos consumidos fora da igreja, no caminho descendente do pecado? Eis o que o Senhor nos diz através de Ellen G. White: "A única maneira de podermos remir o nosso tempo consiste em utilizar o melhor possível o que nos resta, tornando-nos coobreiros de Deus no Seu grande plano da redenção da humanidade."10

Imaginemos o paradoxo de um cristão deprimido, vergado ao peso de amargas recordações, olhos fixos nas pegadas deixadas no terreno do inimigo, mortificando-se, abominando-se - o coração apertado pelo anseio desesperado de remir o tempo!... Ao seu lado há mãos estendidas e olhos suplicantes! Chegam-lhe aos ouvidos gemidos de quem está prestes a sucumbir por não aguentar mais o peso da cruz das suas deficiências ou dos reveses da vida! Almas solitárias, sem Deus e sem esperança, vagueiam entre a multidão que se atropela nas calçadas, e há aleijados do corpo e do espírito dormindo ao relento sob as sacadas dos prédios!...
Se algum dia encontrarmos um companheiro de jornada nessa paradoxal situação, não o apedrejemos com um olhar farisaico; estendamos-lhe a mão e lembremos-lhe com amor fraternal: "A única maneira de podermos remir o nosso tempo consiste em utilizar o melhor possível o que nos resta..."
Envergonhado das suas queixas, ele se levantará decidido a retomar o trabalho em favor dos que perecem - aliás, a melhor terapia para o desânimo e a depressão!


Que diremos mais do valor do tempo? Quanto vale um minuto, uma hora, um dia?... No sofisticado mundo dos negócios, um minuto pode valer milhares, talvez milhões de escudos, mas não é a natureza monetária do valor do tempo que nos preocupa...
Numa sala de cirurgia ou num sector de urgências de qualquer instituição hospitalar, alguns segundos podem significar a recuperação de uma vida ameaçada por uma "paragem cardíaca".
Três ou quatro minutos de afogamento numa piscina chegaram para inutilizar o cérebro de uma encantadora criança de quatro anos de idade, reduzindo-a à mais deplorável condição de vida vegetativa.
Em cada minuto que passa, vinte e quatro seres humanos, dos quais dezoito são bebés, morrem de fome algures no mundo.11


Venha comigo ao "ontem" do tempo e avaliemos a carga de "consequências eternas"12 que pesa sobre cada momento:

A - Para Moisés, o irrepreensível condutor de Israel, o desgosto de não poder entrar na terra prometida foi o resultado daquele momento infeliz em que ergueu a vara e feriu a rocha com irritação.

B - Um brado de triunfo do exército israelita foi o saldo de um curto segmento de tempo, quando a pedra certeira de David derrubou o jactancioso gigante filisteu.

C - Quando o pusilânime Pilatos ressuscitar para rever o "terrível espectáculo"13 da condenação e morte de Jesus, ficará horrorizado ao constatar a dimensão daqueles breves segundos em que lavou as mãos ao declarar-se inocente do Seu sangue.

D - Mas é do Calvário que vem o exemplo mais emocionante: "Senhor, lembra-Te de mim quando entrares no Teu Reino." "Em verdade te digo hoje, estarás comigo no Paraíso."14 Num curto lapso de tempo, um pecador, arrependido e justificado, recebe a garantia de viver para além do tempo!


Se pudéssemos prolongar um pouco mais esta viagem através do túnel do tempo, deter-nos-íamos junto aos escombros da velha e romântica Lisboa de 1755, parcialmente destruída por um violentíssimo tremor de terra de natureza profética, em cerca de seis minutos;15 visitaríamos as ruínas de Pompeia, de S. Pedro de Martinica, de Messina... cada uma das quais com um saldo de milhares de vidas sacrificadas em poucos segundos.

Não sei o dia nem a hora em que deixaremos de ouvir a pulsação do tempo no tic-tac do relógio, mas sei que as sombras da noite cobrem a terra e que se aproxima a Hora, tenebrosa para os ímpios, de livramento para os santos.


É quase meia-noite! Após seis mil anos de pecado, sangue, suor e lágrimas, o velho e cansado mundo arrasta-se penosamente para o fim do "tempo do fim".

Brevemente o brado da Cruz: "Está consumado!"16 repercutirá no santuário celestial com uma nova dimensão: "Está feito!"17 Jesus proferirá, então, o solene aviso:
"Quem é injusto, faça injustiça ainda; e quem está sujo, suje-se ainda; e quem é justo, faça justiça ainda; e quem é santo, seja santificado ainda."18
"Agora, enquanto o nosso grande Sumo Sacerdote está a fazer expiação por nós, devemos procurar tornar-nos perfeitos em Cristo..."19

       AGORA é o tempo de nos prepararmos para a Crise que se aproxima!
       AGORA é o tempo de confessarmos e abandonarmos todo o Pecado!
       AGORA é o tempo de partilharmos a Fé com renovado fervor!
       AGORA é o tempo de investirmos liberalmente na finalização da Obra de Deus!


"Então aquela voz, mais harmoniosa do que qualquer música que tenha soado já aos ouvidos mortais, é ouvida a dizer: 'Vosso conflito está terminado'. 'Vinde benditos de Meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo.'"20

No "amanhã" do tempo, ainda teremos tempo para contemplar as cicatrizes do pecado no corpo de Jesus! As feridas, curou-as o tempo, mas as marcas... nem o tempo, nem a eternidade as apagarão!...


Linda prosa poética com profundas verdades... de Deolinda Correia Leite Borgström, Professora de Música, in Revista Adventista, Novembro de 1990.


Bibliografia:
1 - Niels - Erik A. Andreasen, Tempo Para Viver, p. 2; 2 - Ibid; 3 - 1 Timóteo 6:16; 4 - Ellen G. White, Vida e Ensinos, p. 234; 5 - Ellen G. White, Educação, p. 304; 6 - Ibid, p. 307; 7 - Ibid; 8 - Floyd Rittenhouse, Os Caminhos de Deus, p. 13; 9 - Ibid, p. 85; 10 - Ellen G. White, Parábolas de Jesus, p. 342; 11 - William Johnsson, Revista Adventista (Portugal), Fev. de 1990, p. 3; 12 - Ellen G. White, Parábolas de Jesus, p. 343; 13 - Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 664; 14 - S. Lucas 23:42 e 43; 15 - Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 303; 16 - João 19:30; 17 - Ellen G. White, História da Redenção, p. 402; 18 - Apocalipse 22:11; 19 - Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 621; 20 - Ibid, p. 644.


domingo, 1 de junho de 2014



Quem imaginaria que em Lisboa havia uma coisa dessas? Um hospital para bonecas, no coração da cidade, Praça da Figueira, 7. Foi fundado vai para 170 anos, esteve quase a fechar. Todavia, há dez anos atrás, Júlia Valentim e Manuela Cutileiro, suas proprietárias actuais, impediram que isso acontecesse, para satisfação de crianças e adultos.
Um projecto a pensar na criança que persiste em viver dentro de cada um de nós. A prova de que os afectos são essenciais à vida. Mantê-los já é sinónimo de saúde.

São dos mais diversos feitios, materiais e origens. Chegam normalmente em estado lastimoso. É uma perna ou um braço arrancado. É uma cabeça partida. É um rosto esfacelado. É um ventre dilacerado. É uma careca luzente a pedir cabeleira nova. "Às vezes entra-nos aqui cada coisa que nem sabemos por onde pegar-lhe", conta-nos Mª Júlia Valentim, sócia do singular estabelecimento "hospitalar" e nossa anfitriã.
Vêm pela mão de uma mãe ou de uma avó e mais raramente pela mão de uma criança.
Excepcionalmente, são trazidas também por homens, como foi o caso daquele advogado que ali "internou" o "menino" de porcelana e cara rosada, que desde miúdo o acompanha e de que não se quer separar, pois funciona para ele como talismã.
Há quase sempre uma razão afectiva por detrás da decisão de mandar "tratar" ou "operar" as simpáticas figuras. A primeira boneca de cada criança é quase sempre a que é trazida ao "hospital". Júlia Valentim explica-nos que as mães das jovens que vão casar tomam a iniciativa de mandar reparar as primeiras bonecas ou ursos de peluche das suas filhas para que os levem, refeitos, para as novas casas. Mas situações há em que ao afecto se vem juntar também interesses materiais. Há bonecos que, de tão antigos, são verdadeiras raridades, valendo por isso bom dinheiro.

Os "doentes" são atendidos na recepção que funciona no rés-do-chão, recebem um número de inscrição e esperam que chegue a "ambulância" (uma alcofa com uma cruz vermelha que sobe e desce por meio dum sistema de roldanas) e os iça até ao 4º andar, onde ficarão "internados" na "enfermaria" (chefiada pela D. Maria Antónia), à espera de entrarem nas salas de "cirurgia plástica" (onde a operadora-chefe é a Catarina, uma jovem estusiasmadíssima, rodeada de tesouras, bisturis, agulhas e perfuradores eléctricos), de "transplantes" e, quando o caso é irremediável, na "morgue". Tudo devidamente identificado por tabuletas nas portas.
Existe também a inevitável "farmácia", onde se guarda toda a espécie de mezinhas que servem para devolver as cores e o aspecto que se convencionou serem sintoma ou sinónimo de saúde.
Os olhos das crianças esbugalham-se e ficam muitas vezes marejados de lágrimas ao verem a "ambulância" partir com os objectos dos seus afectos, em direcção ao alto. A separação é dolorosa, e muitas delas chegam a telefonar para saberem se a "cama" onde dormem é boa e se a recuperação corre bem e rápida.

E quando vêm em grupos, com os colegas da escola, é o bom e o bonito. Acotovelam-se para chegarem mais à frente, ardendo em curiosidade e querendo tocar em tudo o que veem. Perguntas são mais que muitas e os comentários sempre surpreendentes.
Júlia Valentim sorri, quando nos confessa que este é um dos aspectos mais compensadores no "negócio": "Há também um fim pedagógico nisto. Os miúdos aprendem que não se deve estragar as coisas de que se gosta e que é importante guardar, preservar os objectos a que nos liga uma certa afectividade, que há laços entre pais e filhos que devem ser mantidos pela vida fora."

Entusiasmo igual ao dos miúdos só o que é revelado por fotógrafos e operadores de câmara que têm a sorte de descobrir aquela mina de imagens e situações. "Há sempre mais um pormenor que querem captar", diz-nos a nossa guia, ansiosa para nos conduzir até à secção dos "recuperados" ou "doentes com alta". E não resiste, ela também, a posar para a fotografia, segurando na mão, primeiro, uma boneca de porcelana perfeitamente recuperada e, logo depois, com um ursinho de peluche restaurado.
"Recuperamos todo o tipo de brinquedo. Mas também fazemos trabalhos de restauro em imagens sacras, em porcelanas, louças 'Companhia das Índias', etc. Fizemos restauro também para o Museu da Marinha, para o Hotel do Buçaco, entre outras instituições". Segundo Júlia Valentim, clientes é coisa que não falta ao Hospital das Bonecas. Há clientes de todo o país e até do estrangeiro.


Texto de uma Revista Médica OXIGÉNIO



SÍNDROME  DO  BEBÉ  SACUDIDO/ABANADO


       Se os bebés falassem era este o apelo que fariam aos pais sempre que, frustrados com o choro incessante, se sentem tentados a abaná-los, numa tentativa desesperada para os acalmar. Mas este é um gesto com consequências graves: lesões cerebrais e até a morte podem ser o desfecho.
       Os bebés choram. E choram muito. Porque têm fome, sede, frio, calor, porque têm a fralda molhada ou suja, porque há muito barulho à sua volta, porque têm cólicas, porque estão desconfortáveis, porque querem mimo... Porque sim!
       Chorar é a linguagem dos bebés, uma linguagem muito própria que exige dos pais um constante trabalho de descodificacão, tentar perceber as quase imperceptíveis alterações na tonalidade e intensidade do choro. De tal forma que às vezes só os pais - outras nem os pais - as distinguem. Ainda privados do dom da palavra, é assim que os bébes se integram no mundo e integram o mundo em si próprios. Primeiro choram, mais tarde sorriem, depois lá virão os primeiros sons articulados e finalmente as palavras. Códigos que os adultos tentam assimilar, nem sempre com sucesso. Pais e filhos crescem ao mesmo tempo, afinal... Mas o que fazer quando eles não estão doentes, não têm fome, nem sede, nem frio nem calor e a fralda está limpa e seca e, ainda assim, insistem em chorar como se o mundo fosse acabar? O que fazer quando eles choram inconsoláveis, resistindo a todos os mimos e truques que os pais conhecem e inventam para os acalmar? O que fazer quando embalar o berço ou passeá-los ao colo é o mesmo que nada fazer? À medida que todas as tentativas fracassam, vai aumentando o stress dos adultos, à beira de um ataque de nervos, sem que a bonança pareça tomar o lugar da tempestade. Às vezes é o descontrolo, a irracionalidade dos comportamentos perante a irracionalidade do choro. E os adultos agarram na criança e abanam-na, como se quisessem exorcizar o choro. Agitam-na no ar, vezes sem conta, em movimentos imparáveis de vai e vem, até que ela de facto se cala.

LESÕES PARA A VIDA  OU  A VIDA EM RISCO

       Porém, danos severos podem ter sido entretanto causados no pequeno corpo. Danos que não se notam e para os quais os pais ainda estão pouco alertados. Porém, em países como os Estados Unidos há muito que se investiga este fenómeno, a que médicos deram o nome de shaken baby syndrome - numa tradução literal para o português "síndrome do bebé sacudido/abanado".
       Que danos são afinal esses? Quando um bebé é agitado vigorosamente, a cabeça move-se para a frente e para trás, num sem número de movimentos repentinos que aumentam a pressão sobre o cérebro e podem causar hemorragias.
       Basta lembrar que a cabeça de um bebé é desproporcionalmente grande em comparação com o resto do corpo, assemelhando-se a um pêndulo quando agitado de um lado para o outro. O grau de dano cerebral depende da quantidade e duração dos abanões, se bem que ainda não esteja definido um limite a partir do qual existe perigo para a criança. Mas casos há em que bastam cinco segundos para produzir estas lesões.
       O que se sabe é que os sinais e sintomas desta síndrome compõem um vasto espectro de alterações neurológicas, que vão desde vómitos, letargia, tremores e irritabilidade a situações mais graves como ferimentos, coma e mesmo a morte. Na origem destas alterações neurológicas está a destruição de células cerebrais em consequência do trauma, falta de oxigénio e inchaço do cérebro.
       Na maioria dos casos ocorrem também hemorragias na retina ou num dos olhos. Em casos mais violentos, são igualmente frequentes fracturas nos ossos dos membros superiores e inferiores e nas costelas. Porém, na maioria das vezes não há sinais exteriores de trauma, na cabeça ou no corpo, o que torna mais difícil o diagnóstico. Mas o trauma existe e, segundo os estudos já desenvolvidos, em 20% dos casos conduz à morte do bebé. Nos que sobrevivem é possível encontrar sequelas como desordens na aprendizagem e alterações comportamentais, atraso no desenvolvimento mental, paralisia e cegueira. Para quem provavelmente nunca ouviu falar nesta síndrome, o quadro é de facto assustador. E suscita dúvidas: o que acontece àquelas brincadeiras de que as crianças tanto gostam em que os pais as atiram ao ar e dão reviravoltas? Não têm de acabar! Se as brincadeiras forem adequadas à idade muito dificilmente causarão danos físicos. É claro que atirar um bebé ao ar contém os seus riscos, mas o maior de todos é se ele cair ao chão. Aliás, há uma substancial diferença na força usada quando se abana violentamente um bebé e naquela que está presente quando ele simplesmente tropeça e cai: é que no primeiro caso é dez vezes superior.

UMA FORMA DE MAUS TRATOS

       Esta é uma síndrome que anda muito associada aos episódios de maus-tratos infantis. Pelos hospitais portugueses passam casos de bebés que acabaram por morrer em consequência de violência sobre eles exercida pelo adulto que devia tomar conta mas não soube controlar os impulsos, agitando-o até conseguir que se cale. É claro que, em circunstâncias normais, quando um pai tenta a todo o custo acalmar o choro desesperante de um bebé não pretende magoá-lo. Mas é isso que acontece se decidir sacudir o pequeno corpo até o choro cessar. A verdade é que o bebé deixa de chorar e nada no seu comportamento imediato indicia que possa ter sido magoado. Mas, ironicamente, a presença de uma lesão pode fazer precisamente com que o choro acabe. E quando um bebé deixa de chorar, o comportamento do adulto, inicialmente ditado pelo stress, pode passar a ser a regra, usado de cada vez que o pequeno ser resolva manifestar-se ruidosamente. É um perigoso ciclo vicioso para o qual pais e educadores devem estar alerta. Por isso, da próxima vez que o seu bebé decidir chorar com toda a força dos seus pequeninos pulmões, comece por contar até 20, até 50 ou até 100, se necessário for...

LEMBRE-SE QUE...

Da próxima vez que o seu bebé chorar desalmadamente não desespere.
* Um bebé normal pode passar 2 a 3 horas por dia a chorar.
* Há mil e uma maneiras de acalmar um bebé.
* O choro funciona como um isco: aumenta o stress dos pais, atrai a sua fúria e leva a comportamentos descontrolados.
* Abanar um bebé pode ser perigoso, podendo causar-lhe danos severos ou mesmo a morte.
* A força de um pai à beira de um ataque de nervos aumenta significativamente.
* Não pegue no bebé quando estiver a ter uma discussão.
* Não brinque com o bebé abanando-o.
* Um bebé que chora não faz de si um mau pai ou uma má mãe: deixe-o chorar, desde que o vá vigiando.

SE UM BEBÉ CHORA...

Quando um bebé chora está a comunicar as suas necessidades e desejos, a fazer queixas e a reclamar cuidados. Por isso, quando o seu bebé chorar verifique:
* Se está na hora de comer ou se tem sede.
* Se tem frio ou calor.
* Se a roupa está demasiado apertada.
* Se a fralda está molhada ou suja.
* Se tem cólicas ou qualquer outro sintoma físico.

Se a resposta a estas hipóteses for negativa e ele continuar a chorar, tem duas hipóteses: ou espera que ele se acalme por si ou tenta acalmá-lo (o que acontece quase sempre, pois não há pai ou mãe que resista ao choro do seu bebé...).

Se optar por apaziguar o choro pode tentar algumas estratégias:


* Fale com ele, cante-lhe uma canção de embalar, faça-o ouvir música suave.
* Relaxe-o com massagens suaves - o toque é um verdadeiro calmante.
* Embale-o ao colo ou sobre os joelhos.
* Ofereça-lhe a chucha.
* Distraia-o com um brinquedo colorido ou que emita sons.
* Coloque-o no carrinho e dê um pequeno passeio na rua.
* Peça ajuda, se puder, de modo a evitar entrar em stress.
* Deixe-o chorar se nada resultar.
* Aconselhe-se com o pediatra se o choro se mantiver e a sua preocupação também.

Faça tudo o que estiver ao seu alcance, mas nunca por nunca sacuda o seu bebé!


Texto de uma revista da ANF - Associação Nacional das Farmácias; autor desconhecido.