quarta-feira, 1 de junho de 2011

O ÚLTIMO BRINQUEDO


Lembro-me perfeitamente do último brinquedo que os meus pais me compraram: uma enorme nave espacial do então popularíssimo He-Man, herói loiro e musculado que ao lado da bombástica She-Ra (sua irmã gémea) combatia as forças do malvado Skeletor. Eu já tinha uma vasta parafernália de bonecos, incluindo o castelo Grayskull e o tigre verde que He-Man cavalgava nas batalhas, mas a nave espacial era a cereja em cima do bolo, longamente desejada.
Namorei-a durante tanto tenpo que quando chegou a altura de a comprar devia ter uns 14 ou 15 anos, e portanto já estava na idade em que era suposto gostar mais das minhas colegas de carne e osso do que de brinquedos de plástico... Resultado: a nave espacial foi comprada meio às escondidas, num misto de desejo e de vergonha, e jamais falei dela aos meus amigos - seria uma brecha infantil no muro do 'já não sou criança' que naquela altura tanto trabalho dava a pôr de pé.
Durante anos e anos, os brinquedos haviam sido uma fonte de perpétua felicidade. Achava impensável que um dia pudesse deixar de gostar deles: eu não iria ser como os outros, viveria até ser velho rodeado de fortes e naves espaciais, em batalhas épicas onde os maus tinham sempre mortes de curta duração - logo voltavam, mais malévolos e terríveis, disponíveis para vender cara a pele na próxima (e inevitável) derrota.
Todas estas memórias regressaram há 15 dias quando fui ao cinema com os meus filhos ver o maravilhoso Toy Story 3, um filme que parece que é para eles mas que é em primeiro lugar para nós, os adultos, eternos nostálgicos da nossa infância.
Adivinhem quem estava a limpar os olhos no final? Não eram eles, não - o momento em que Andy entrega os seus melhores brinquedos a uma nova criança é uma das cenas mais comoventes de toda a história do cinema de animação.
E é comovente porque nós nos revemos nela, porque quando temos filhos essa cena acontece em cada uma das nosssas casas. O Tomás hoje em dia dá nova vida aos meus índios e cowboys, aos gladiadores já sem tinta e aos carros com que fiz notáveis corridas entre as pernas das cadeiras da minha sala. Nas suas pequenas mãos, os meus velhos brinquedos ganham uma nova vida. Por isso, na próxima visita a Portalegre acho que vou mergulhar no sótão à procura da nave espacial do He-Man. Conheço a pessoa certa para a pôr a voar outra vez.

João Miguel Tavares - Jornalista
Ilustração de José Carlos Fernandes



UM TEMPO PARA SI

Ele era um jovem casado, pai de um filho de seis anos. Ao olhar para o futuro, queria ser capaz de dar à sua família mais do que aquilo que o seu actual trabalho e salário permitiam. Por isso, começou a sua própria empresa.
Ser propretário de uma empresa pode parecer empolgante, mas a maioria das pessoas não compreende o tremendo dispêndio de tempo que um negócio implica. Deu por si a trabalhar doze, catorze e até dezasseis horas por dia, sete dias por semana. Essa situação prolongou-se durante meses. Como era de esperar, um horário desses reflectiu-se na sua família.
Um dia, estava este jovem empresário no trabalho, quando deu por falta de um papel de que precisava com muita urgência. Tinha-o deixado em casa. Assim, durante a hora do almoço, foi buscá-lo. Subiu as escadas a correr, foi ao quarto, agarrou no documento, e voltou a descer, sempre a correr. Já ia a meio da sala de jantar quando o seu filho o viu. O menino já não estava com o pai há semanas, uma vez que, quando acordava, já ele tinha saído e, quando o pai regressava a casa, já ele estava a dormir.
"Papá, papá", gritou o menino a correr para ele. "Fica comigo!" Agarrado à perna do pai, recusava-se a deixá-lo partir. Não conseguindo livrar-se do filho, o pai ajoelhou-se e deu-lhe um abraço.
O sétimo aniversário do filho seria em breve, por isso disse-lhe: "Agora tenho de ir para o trabalho, mas volto já. Está quase a chegar o teu dia de anos. O que queres que te dê? Diz-me que eu compro. O que tu quiseres!"
O menino respondeu: "Quero-te a ti, Papá."
"Mas tu tens-me", respondeu. "Diz-me só o que tu queres para os teus anos e eu compro-te, se me deixares voltar para o trabalho agora. Queres um jogo de vídeo, um cãozinho ou um combóio eléctrico? O que é que tu queres?"
"Só te quero a ti. Quero que passes o dia comigo, Papá."
Foi então que ele percebeu que tinha de fazer mudanças drásticas na sua vida. Tomou consciência de que tinha tentado comprar o seu filho com coisas, quando tudo o que ele queria, realmente, era o tempo do seu pai. O seu filho queria mais passar tempo com o pai do que qualquer outra coisa.


Mike Tucker in Um Tempo Para Si



«BRINQUEDOS SEM AMOR»

(Tempo e Presença)

«NÃO PRESTAM!»


Alexandre Correia